MUX

O Projeto MUX FREE

O projeto MUX já em 2006, após a etapa PDR, apresentava sinais que haveria pesado cerco e grandes dificuldades na compra de componentes qualificados, e especializados insumos para uso espacial. Os embargos e boicotes estavam paralisando as atividades.

Importante salientar que de acordo com as regras presentes na licitação, e em especial segundo o documento INPE RBN-HDS- 0014/02, e sua decorrência direta o documento RB-DCS-0001 Design & Construction Rules, a equipe tinha que seguir certas recomendações, e em alguns casos, algumas determinações, na escolha e seleção dos componentes que seriam utilizados na MUX.

Estas determinações, em resumo, forçavam a escolha de certas classes de componentes, e obrigava a escolha daqueles que de fato tivessem histórico positivo de uso espacial, ou que já houvesse documentação a respeito da qualificação e uso no espaço. Em poucas palavras, era recomendado o uso de certa classe de componentes que a NASA ou ESA tivessem publicado na famosa lista QPL (Qualified Products List). Caso o projetista não escolhesse um componente presente em tal lista QPL, deveria ser proposto um complexo processo de qualificação dele.

A medida que o projeto MUX caminhava, ficou evidente que a lista QPL era monitorada, e aqueles componentes que estivessem na lista, seriam objeto da Lei americana ITAR.

A Lei americana ITAR de International Traffic in Arms Regulation , voada pelo congresso americano, impede que certos componentes, sejam disponibilizados para certos programas.O CBERS estava entre estes programas considerados com contrário aos interesses daquele país, e portanto quaisquer componentes que fossem solicitados pela OPTO para o projeto MUX, seriam negados.

Isso criou um impasse no andamento do projeto, visto que não seria possível utilizar a QPL, ou seja, um requisito da licitação, devido os embargos decorrentes. Ou seja, o ITAR estava impedindo o cumprimento de requisito basilar do projeto. Devido a Lei 8666, isso poderia ser considerado falta contratual, e, portanto, a OPTO passível de sanções administrativas perante o INPE.

Esta situação se tornou crítica em 2007 quando também o INPE sofreu embargos ITAR, e assim todo o cronograma seria inviabilizado.

Logo se concluiu que seria necessário um esforço adicional, não previsto em contrato, de encontrar soluções não sujeitas ao ITAR para o programa MUX.

Depois de muitas negociações a OPTO e o INPE chegaram em um consenso que seria necessário um esforço adicional para encontrar um projeto MUX, que não fosse sujeito a boicotes e embargos, e para tanto, as especificações deveriam permitir o uso de componentes fora da QPL e também que os componentes críticos sem histórico de uso espacial deveriam ser submetidos a um programa de qualificação.

Todo este esforço motivou o desenho de uma versão nova da MUX, que foi batizada de MUX FREE, pois deveria ser um projeto ITAR FREE. Uma proposta de aditivo contratual foi submetida e aprovada pelo INPE em outubro de 2007, e foi chamado de “ME2 MUX FREE”. Seria um protótipo adicional ao programaMUX, que deveria ser projetado e construído o mais livre possível de embargos e boicotes, desenvolvendo as tecnologias que fossem necessárias para atingir a mesma especificação funcional da MUX conforme a especificação presente na licitação.

O INPE aprovou o aditivo contratual em a OPTO pode desenvolver importante demonstrador de tecnologia. São várias as inovações que foram criadas, inteiramente desenvolvidas na OPTO e qualificadas. Destacam-se as seguintes:

  • Uso de componentes off-the shelf: vários componentes foram submetidos a ensaios verificando o seu comportamento perante os efeitos da radiação especial. Isso obrigou a mudança de certas arquiteturas, utilizando componentes mais antigos e com diversidade de fornecedores, livres do ITAR, o que trouxe a decorrência de o conjunto eletrônico ser um pouco maior de mais pesado que o original utilizando componentes QPL. Uma eletrônica “mais pesada e volumosa” foi descoberta e ensaiada exaustivamente. O uso de blindagens mais robustas também foi empregado.
  • Para contornar o problema do peso adicional acima, a equipe OPTO propôs utilizar lentes anesféricas no conjunto óptico. A justificativa era que as lentes anesféricas, quando desenhadas adequadamente, poderiam fazer o serviço de duas ou mais lentes esféricas convencionais. Ou seja, para atingir o mesmo desempenho óptico, utilizando lentes anesféricas, seria possível desenhar um canhão óptico menor e mais leve e com isso ganhar peso que seria utilizado pela eletrônica extra, devido ao ITAR. A motivação para o uso de lentes anesféricas advém da capacidade que seu emprego proporciona ao aumento de desempenho e redução do número de superfícies. Este fato pode abrir espaço para eventual redução do peso do sistema óptico, liberando margem para o uso de componentes eletrônicos alternativos para o sistema, fugindo dos boicotes e restrições encontradas até então.Além disso , o emprego de lentes anesféricas pode permitir a ampliação de certas características de desempenho não cobertas no projeto original.No entanto, o uso de lentes anesféricas requer cuidadoso sistema produtivo, requer maquinas especializadas e pessoal treinado, atributos somente agora disponíveis na companhia. A Opto Eletrônica S.A. adquiriu máquinas de produção anesféricas especializadas, mediante financiamento BNDES, sistemas de medida, e treinou pessoal que permitem finalmente o uso destes tipos de máquinas e lentes.
  • Em decorrência do acima, uma enorme família de vidros ópticos “comerciais” foram ensaiados contra a radiação, e seu comportamento levantado. Ensaios no IPEN-USP e no IFSC-USP foram feitos, permitindo que o projeto escolhesse aqueles vidros que permitissem o uso de blindagens leves, garantindo a vida mínima no espaço.
  • Idem foi feito com uma serie de materiais como colas, resinas, plásticos, isoladores térmicos, mantas térmicas.
  • Como o uso de certos mecanismos qualificados para uso espacial estavam bloqueados pelo ITAR, a equipe OPTO teve que estudar formas de contornar esta indisponibilidade. Este entrave foi especialmente crítico no mecanismo de ajuste de foco da MUX, previsto originalmente para empregar itens já qualificados pela NASA, devido sua criticalidade. No entanto devido o ITAR não ficaram disponíveis. A Equipe OPTO enfrentou o desafio de encontrar componentes industriais de alta confiabilidade, realizar uma bateria enorme de ensaios, terminando por conceber um mecanismo ITAR FREE, qualificado. Varias abordagens foram criadas, e cita-se em especial um protótipo empregando mecanismos auto alinhantes sem fim de curso, que hoje se encontra em voo no espaço. Outra concepção utilizando propriedades térmicas para ajuste de foco, tecnologia considerada arrojada demais para o programa, mas que acabou sendo mais tarde seria motivo de financiamento especifico visando emprego em pequenos satélites.
  • Vale também a menção sobre o embargo dos filtros ópticos multiespectrais e o INPE, responsável pelo seu suprimento para a OPTO levou dois anos para encontrar fornecedor alternativo que não estivesse submetido ao ITAR e pudesse ser adquirido. Neste meio tempo, a OPTO submeteu proposta ao FINEP para desenvolvimento destes filtros. Com apoio do INPE o projeto foi aprovado, e o projeto paralelo de desenvolvimento foi iniciado. Devido ao cronograma, estes filtros desenvolvidos pela OPTO não seriam utilizados na MUX e CBERS, porem foram empregados no projeto AWFI, Amazônia I, a ser descrito adiante.

No final de 2010 todas as tecnologias acima foram desenvolvidas, e a maioria delas empregadas no programa MUX original, a partir do modelo QM, sendo empregadas no FM1, FM2 e FM3. Hoje operando em órbita. Estes resultados acabaram se tornando importante base tecnológica nacional. São soluções ITAR FREE, que são virtualmente imunes a embargos e boicotes, se tornando importante patrimônio tecnológico nacional. O INPE hoje é o repositório de todos os ensaios, dados e resultados, e mais importante, de todo o acervo técnico resultante. Este acervo, base de importantes práticas e dados se tornou referência para os projetos nacionais do futuro, constituindo assim uma “QPL verde amarela”. O protótipo da MUX FREE, que foi exaustivamente ensaiado e testado, hoje se encontra no INPE armazenado, disponível para gerações futuras.

Protótipo EM2 MUX FREE em ensaios no LIT-INPE em 2009.

Protótipo EM2 MUX FREE em ensaios na sala limpa OPTO em outubro de 2008.

Canhão Opticoanesferico do EM2 MUX FREE, em processo de alinhamento na sala limpa da OPTO em maio 2008.

Por empregar lentes anesféricas, o procedimento de alinhamento e montagem foi especialmente desenvolvido. Uma série de ferramentais e procedimentos foram criados, evitando ao máximo os embargos ITAR.

Os Projetos MUX, MUX FREE e posteriormente a WFI exigiram a contratação de pessoal com capacidades e talentos diferenciados. Uma equipe de mais de 80 profissionais foicontratada,e no final do programa, em 2013, haviam sido contabilizados mais de 150 profissionais que colaboraram diretamente com o programa.

Os profissionais eram provenientes das melhores escolas do país. Foram contratados Físicos, Engenheiros eletrônicos, Engenheiros aeronáuticos, mecânicos, materiais, bem como equipe de planejamento e especialistas em certificações. O investimento da OPTO Eletrônica neste pessoal foi significativo, com amplo programa de treinamento. Alguns especialistas foram contratados no exterior, principalmente para treinar a equipe em desenho óptico, cálculo térmico, Eletrônica com robustez a radiação. Alguns profissionais foram enviados para o exterior para treinamentos rápidos em óptica, filmes finos e programações FPGA para missões críticas.

O grande investimento foi feito não somente visando os programas CBERS, mas vislumbrando que o Brasil daria continuidade aos programas e com isso a MO seria continuamente empregada. Esta visão também se refletiu no investimento em infraestrutura, aonde salas limpas e larga infraestrutura instrumental foram criadas.

O programa foi um sucesso, e as câmeras MUX foram entregues e operam no espaço com sucesso. Porem a visão de continuidade dos programas não ocorreu. Após o térmico da MUX e WFI em outubro de 2013, paulatinamente todos os programas espaciais do Brasil foram sendo interrompidos ou cancelados, e o que acabou causando a dispersão da equipe.

Em estudo feito em 2012 o perfil da equipe tinha que tinha colaborado diretamente com o programa MUX na OPTO tinha a seguinte titulação

  • 12 Doutores( Optica, Física Aplicada, Mecânicaestrutural, Analise térmica, EletronicaInstrumental, Processamento de Sinais, Efeitos da Radiação)
  • 32 Mestres (óptica, Engenharia Eletrônica, Engenharia Estrutural, Software , Certificações, eletrônica instrumental, Gestão)
  • 38 Graduados (EngenheirosEletrônicos , mecânicos , Aeronáuticos, Matemáticos, Físicos, Engenheiros Materiais, )
  • 14 Técnicos (Eletrônicos e Mecânicos, todos qualificados para montagens especiais pelo INPE e CTA)

Em 2016 a equipe havia sofrido com as paralizações do programa AWFI, não assinatura do ToT do SGDC, os programas de defesa, o que obrigou a OPTO Eletrônica a vender a Divisão.

Em estudo realizado em 2016, foi feito o levantamento de qual foi a dispersão da MO e qual o destino da especializada e pioneira equipe que trabalhou no programa MUX, WFI , AWFI e os dados são os seguintes:

  • 14% da equipe permaneceu na OPTO Eletrônica até 2017 quanto foi transferida para a OPTO S&D na venda da divisão para o Grupo Akaer/SAAB
  • 6% permaneceram na OPTO Eletrônica após 2017 atuando no desenvolvimento de produtos médicos
  • 34% da equipe foi para o exterior, estando hoje empregados em renomadas multinacionais do ramo espacial e de alta tecnologia, a maioria em engenharia de aplicações, porem sendo que dentre estes, alguns já galgaram posições de direção em suas divisões. A probabilidade de retorno ao Brasil destes profissionais é nula.
  • 12% estão hoje empregados em Bancos de investimento e fundos privados.
  • 10% foram contratados por universidades públicas e privadas, com especial destaque na UFSCAR, USP São Carlos, UFSC e UNB
  • 5% abriram o próprio negócio, não atuando no ramo defesa ou espaço;
  • 4% estão hoje contratados como auditores da Receita Federal ou Estadual
  • 3% foram contratados por órgãos públicos diversos, sendo que um galgou o prestigioso cargo de delegado da Polícia Federal
  • 12% com destino desconhecido, dispersos no mercado, com perda de vínculos.

Equipe OPTO no envio dos primeiros canhões WFI-OMB Fm1 para integração na Equatorial Sistemas, em maio/2011.

Foto do MUX FM2 sendo testado em outubro 2012. Como tradição na OPTO , o nome de todos os colaboradores foi inscrito na tampa traseira.

“Seu Nome foi para o espaço” Na tampa de fechamento de todos os modelos das câmeras fabricadas pela OPTO, os nomes de todos os colaboradores foram gravados. Foto do envio do FM1 em 28/03/2012.

Foto de toda equipe OPTO durante o envio da MUX FM1 para China em 30/03/2012, embarcada em seu container, no caminhão ao fundo.

1. WFI (Behind antenna)

2. MUX (Main radiator shown)

Fotos das câmeras MUX e WFI sendo integradas no Satélite CBERS 3, em novembro de 2013, na China. Foto INPE.

Fotos das câmeras MUX e WFI integradas no Satélite CBERS 3 , em novembro de 2013, na China. Foto INPE.